O impasse no qual se transformou a Lei 10.632/2017 que prevê o diferimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incidente sobre as operações de madeira em tora de florestas nativas ou plantadas em Mato Grosso parece estar longe de uma solução positiva para o Estado como um todo. O problema surgiu em meados de 2018, quando o Ministério Público Federal em Mato Grosso (MPF-MT) e do Tribunal de Contas do Estado (TCE) interpretaram que a publicação da referida lei resultava em renúncia fiscal e recomendaram a suspensão dos seus efeitos.
Desde então, o Centro das Indústrias Produtoras e Exportadoras de Madeira do Estado de Mato Grosso (Cipem) tem se dedicado a provar, em várias instâncias governamentais e judicial, que a Lei tem procedência lícita e não representa renúncia fiscal, mas a correção de uma inconstitucionalidade provocada pela ausência dela.
A medida foi tomada à época pelo então governador, Pedro Taques, após diversas reuniões com o setor que reivindicou isonomia no tratamento tributário de Mato Grosso em comparação aos demais estados produtores de madeira. Na conta, pesam contra o setor, uma pauta fiscal 50% maior que a de outros estados, cobranças de várias taxas que não existem em outras federações e uma logística de transporte encarecida pelo alto custo do combustível e das péssimas condições das rodovias. Este cenário agrava-se com a cobrança de 17% de ICMS sobre a matéria-prima utilizada pelas indústrias optantes do Simples Nacional, categoria que abrange 95% das empresas do setor.
É neste ponto, precisamente, que há carência de informações e a interpretação equivocada sobre a Lei emerge. As empresas do Simples Nacional não podem se creditar de ICMS, ou seja, o valor do ICMS pago sobre matéria-prima não é recuperado na operação subsequente, de venda. Com isso, na comercialização dos produtos industrializados, as mesmas empresas são novamente tributadas pela apuração no PGDAS. O resultado é uma bitributação, que afronta o artigo 170 da Constituição Federal e o § 4º-A, do artigo 18, da Lei Complementar 123/2007, na redação da dada pela Lei Complementar 147/2014. Há que se considerar, ainda, que sem o diferimento do ICMS previsto na Lei nº 10632/2017, nas aquisições de madeira em toras, o referido imposto incidente sobre a operação é calculado pela lista de preços mínimos. Por exemplo, se pegarmos uma tora de canjerana, a Lista de Preços Mínimos estabelece que a base de cálculo do ICMS seja de R$ 725, enquanto que para a madeira serrada em pranchas, tábuas e vigas, resultantes do processo industrial, estão cotadas na mesma lista ao valor de R$ 586. No exemplo, a empresa recolheria R$ 123,25 de ICMS sobre a madeira em tora, sem direito ao crédito, e mais a tributação do Simples Nacional pelo PGDAS.
Para além da questão legal, a publicação da medida também teve forte argumento econômico. Dados da Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz-MT) mostram que a cadeia produtiva da madeira há muito tempo vinha sofrendo queda na produção e comercialização, provocadas pela situação tributária e fiscal. De 2014 a 2016 a arrecadação de ICMS, por exemplo, caiu gradativamente, dando a entender que o setor de base florestal caminhava para o encerramento de suas atividades. Neste período, o estado arrecadou, respectivamente, R$ 57,4 milhões em 2014, R$ 45,41 em 2015 e R$ 43,46 em 2016, o que corresponde a uma queda de aproximadamente 25%.
Após a publicação da Lei 10.632/2017, que difere o pagamento de ICMS nas operações de madeira em tora, houve um aumento de 10% na arrecadação do imposto pelo Estado. “Diante do exposto e do fato de que diferimento não significa isenção, mas um mecanismo de aumento da arrecadação indireta, é inimaginável crer que o Estado promoveu renúncia de valores”, pontua o Cipem.
Para a organização, essa política econômica assertivamente implementada pelo governo do estado, facilita o aporte de capital do setor, proporcionando desenvolvimento econômico, com geração de empregos e movimentação de toda uma cadeia de produção.
O cancelamento da referida legislação resultará no fechamento dessas empresas e no caos econômico para 44 municípios mato-grossenses que têm o setor florestal como principal fonte de desenvolvimento.
Essa situação ameaça também a conservação dos ativos florestais, pois os 3,7 milhões de hectares de área com planos de manejo florestal sustentável deixariam de cumprir essa função, ensejando a transformação em outros cultivos, resultando, inclusive, no aumento do desmatamento em Mato Grosso. Esse fato, por si só, já acarreta consequências, inclusive, internacionalmente.
Por fim, o Cipem questiona: “Não é meta de Mato Grosso incentivar as atividades sustentáveis? Não há um compromisso assumido por meio de tratado internacional de reduzir as emissões de gases do efeito estufa, incluindo os resultantes de desmatamento? Negar esse fato e submeter o setor florestal a mais esse ônus significa exatamente o contrário de desenvolvimento social, ambiental e econômico”.